O silêncio do inverno, que antes acolhia em repouso, começava a se dissolver em brisas leves. Pelas frestas do sentir, a primavera se insinuava. Não chegava com pressa — apenas sussurrava sua presença. A casa, antes recolhida, agora se expandia em respiro. As janelas entreabertas, os poros do tempo, a pele da alma: tudo se abria, como se um novo ar tomasse conta de dentro.
Primavera não invade. Ela convida. E o que antes dormia, acorda sem alarde.
Foi assim que a casa começou a respirar outra vez.
E com ela, nasceu Inspiro. Não vinha com urgência, mas com profundidade. Era como abrir o peito sem medo. Sentir o ar entrar e limpar. Passava pelos cômodos com a leveza de quem não precisa anunciar-se. Apenas aliviava. Era o convite à pausa sem culpa, ao inspirar profundo que desfaz os nós invisíveis. Na presença de Inspiro, a casa lembrava: respirar é permitir que a esperança entre de novo.
Logo, no rastro dessa brisa, surgia Flores em Mim — a primeira flor a desabrochar. Seu gesto era sutil, como quem se entrega sem pressa de ser vista. Não era doce nem chamativa: era presença delicada. Flores em Mim era a lembrança de que florescer é confiar no tempo. Era a flor que nascia por dentro, sem precisar ser mostrada. A beleza que brota do silêncio. Era ela quem lembrava: "Onde a calma reside, a vida floresce."
Em meio a essa dança de ar e flor, uma chama pequena se acendia: oFio de Luz. Não brilhava para mostrar o caminho — apenas iluminava o que já estava dentro. Sua presença era quase uma linha tênue de calor, tecida entre as paredes e os afetos. O Fio de Luz aquecia sem alarde. Ele lembrava que há luzes que não se veem, mas se sentem — e que o mais sutil dos brilhos pode iluminar o que é mais verdadeiro.
E então soprou o Vento Novo. Leve, mas firme. Como quem vem de longe e sabe exatamente o que precisa levar. Trazia movimento. Não o movimento apressado, mas aquele que transforma. Desprendia as cortinas, agitava memórias, devolvia à casa um ar de recomeço. Com ele, o peso se dissolvia. As estações passadas viravam eco. E no lugar da espera, a disponibilidade para ser.
No corpo da casa, cada presença se expandia: Inspiro, com sua calma que limpa. Flores em Mim, com sua entrega silenciosa. Fio de Luz, com seu calor que guia. Vento Novo, com sua brisa que move.
Primavera não chegou com festa. Ela chegou com sentido. E na casa que respirava, o tempo voltava a florescer por dentro. Aqui mora o começo de tudo.
A casa havia aprendido a respirar. Agora, estava pronta para rir.
Depois do florescer, viria o expandir. A alegria do calor, o canto que transborda, o sol que toca o corpo como se dissesse: “Sinta tudo o que é.”
E quando o verão chegar, será impossível conter a luz.